Por Leandro do Carmo
Travessia Petrópolis x Teresópolis
Relato
Temporada de montanha de 2023, não podia deixar de fazer a travessia mais clássica do país: a “Travessia Petrópolis x Teresópolis”, ou simplesmente “Petrô x Terê”. Acho que essa é a minha sexta vez, mas preciso revisitar meus relatos antigos. É um desafio escrever novamente, mas como toda aventura é uma experiência única, acho que vou conseguir...
Nos reunimos no Clube Niteroiense de Montanhismo e conseguimos alinhar o final de semana de 24 e 25 de junho. O ideal é fazer a travessia em 3 dias, porém, é mais difícil que as pessoas consigam uma folga na sexta ou segunda. Fica cansativo, pois no segundo dia fazemos em 1 dia, o trajeto que geralmente se faz em 2. Quanto a logística, assim como da última vez que fiz, optamos por deixar o carro dentro da sede de Teresópolis e seguir de van para a portaria de Petrópolis, assim, já terminaríamos a travessia no carro. Com todos os detalhes acertados, vinha a parte mais difícil: conseguir vaga. Com a saída da empresa em 2021 que detinha a concessão, agendar a travessia tornou-se uma tarefa difícil, visto a limitação de 40 vagas para pernoite. Tínhamos que monitorar a abertura do agendamento e no dia e hora marcado, enviar o pedido e torcer para que tivéssemos sido bem rápidos. O pior, era que demorava uns 3 dias para que o resultado saísse. Como sou guia do CNM, não preciso fazer agendamento. Entre confirmações e negações, conseguimos fechar o grupo. Decidimos deixar os carros dentro do Parque, em Teresópolis, e seguir de van para Petrópolis para iniciar a travessia, assim como fizemos no ano passado.
1º dia da Travessia Petrópolis X Teresópolis
A viagem foi tranquila. Chegamos ao parque e ainda estava fechado, abriria as 7 horas. A van já nos esperava. Assim que o parque abriu, entramos, estacionamos os carros e seguimos na van até Petrópolis. Fizemos uma parada na padaria que fica na Praça de Corrêas para tomarmos café da manhã. Aproveitei para comprar algo para o meu almoço. Foi dando a hora e seguimos para a portaria do Parque. Já deixamos todos os termos preenchidos e os documentos separados para podermos agilizar a parte burocrática da entrada. Com tudo certo, nos reunimos e como éramos um grande grupo, nos organizamos e definimos nossos pontos de parada. Nossas paradas eram as seguintes: Bifurcação para o Véu da Noiva (parada curta), Pedra do Queijo (parada curta), Ajax (parada longa – almoço), Alto da Izabeloca (parada curta). Decidimos que não precisaríamos caminhar todos juntos, mas que o primeiro só saísse de alguma dessas paradas, se pelo menos um tivesse chegado e encontrado com ele. Assim saberíamos onde cada uma estava. Fizemos uma foto e iniciamos a caminhada.
O dia estava extremamente agradável e a previsão era excelente. Esse início de caminhada serve para um aquecimento. Fomos ganhando altitude bem lentamente, com alguns trechos mais íngremes, mas bem leve se comparados aos trechos à frente. Passamos por algumas entradas de alguns poços que ficam cheios de visitantes durante o verão. Como estávamos no começo do inverno, era muito pouco provável que alguém chegasse ali para um banho. Com cerca de 40 minutos de caminhada, chegamos à Bifurcação para a Cachoeira do Véu da Noiva, nossa primeira parada rápida. Estávamos relativamente pertos uns dos outros e não tivemos problema nesse começo. Era hora de ajustes nas mochilas e no ritmo. Nem a mochila tirei das costas, sentei com ela apoiada. Antes do corpo esfriar, já dei o aviso de que iria continuar a caminhada. Fomos levantando e aos poucos, retornando à subida. Esse era um trecho forte, conhecido como “subida do queijo”.
Andando num ritmo mais lento que o início, fomos ganhando altura. Numa conversa agradável, passei um trecho longo sem perceber e logo estava na entrada para o “Alicate”. Faltava pouco. Mais acima paramos para tirar foto em um belo mirante, onde é possível ver todo o vale do “Bomfim”. Podíamos ver o quanto já havíamos andado e o quanto já havíamos subido. A vista desse ponto é algo impressionante. De volta à trilha, continuamos subindo, mas já com a certeza de que logo pararíamos novamente. Mais um trecho forte e logo estávamos na Pedra do Queijo. Aos poucos todos foram chegando. Na subida é quando mais nos distanciando uns dos outros. É natural, pois cada um tem seu ritmo. Aproveitei para comer alguma coisa. Nessa hora, encontramos o Gabriel e a Carol que haviam chegado antes e optaram por ir até o Véu da Noiva. Agora sim estávamos todos reunidos. Dali conseguíamos ver parte do caminho que ainda faríamos até o final do dia. Difícil até de acreditar que em algumas horas estaríamos lá em cima. Começamos a nos preparar, nossa próxima parada era o “Ajax”.
Voltamos para a caminhada e a primeira subida já é dura. Pegamos uma área com pouca vegetação e um solo bem erodido, o que dificulta um pouco a subida. Com alguns minutos estávamos nesse pequeno cume. A vista dispensa comentários. Desse ponto, iniciamos uma descida, que logo se tornou uma subida novamente. Mas agora, estávamos mais abrigados do sol, o que facilitou um pouco a caminhada. Em um determinado ponto já era possível ouvir vozes, o que com certeza indicava o “Ajax”, pois como tem água no local, a maioria faz uma parada ali. Mais um trecho de caminhada e havíamos chegado. Era hora de descansar e fazer um lanche reforçado, na qual, pelo avançar da hora, poderíamos chamá-lo de almoço. Encontrei alguns amigos e conversamos um pouco. Tivemos bastante tempo. Aproveitei para encher minha garrafa de água. Já deixei tudo pronto, faltava a última subida forte do dia, a “Izabeloca”. Era hora de partir. Começamos a nos preparar e logo estávamos de volta a caminhada.
De volta à trilha e a subida, começarmos serpenteando, já mirando um grande bloco, bem no alto. Aos poucos, nos aproximávamos e a cada minuto a nossa distância se encurtava. Não é um trecho longo, o que ajuda no psicológico. De um certo ponto, era possível distinguir, bem ao fundo, o cruzeiro que fica no Açú. Era o nosso objetivo do dia. Sem perceber, caminhei os últimos metros e quando me dei conta, já estava no alto do chapadão, jogando a mochila num canto e alongando as costas. Um alívio. Faltava pouco para montar acampamento e descansar. Uns seguiram andando. Eu acabei esperando todos chegarem para não nos distanciarmos muito. Foi até bom dar essa parada mais longa. Apesar de uma subida mais curta, já estava com um cansaço acumulado das outras. Como seguiríamos sem grandes subidas, um bom descanso agora seria ótimo para concluir o trecho até os Castelos do Açú.
Com todo mundo reunido, mesmo que todos não fossem começar a andar naquele momento, resolvi pegar a mochila e seguir. O dia estava bem aberto e caminhar nesse trecho não ofereceria maiores riscos. Passei por algumas pessoas que voltavam do Açú e segui andando. Passei direto pelo “Graças a Deus”, um ponto onde há um totem com uma placa. Mais à frente já era possível ver parte da baía de Guanabara. Olhando para trás, deu para ver um grande rastro de fumaça, na direção de onde havíamos subido, com certeza estava acontecendo um grande incêndio por lá. Após contornar uma elevação, foi possível ver os Castelos do Açú. Estávamos bem próximos, faltando apenas alguns metros. Nesse momento, foi como se o corpo tomasse uma injeção de ânimo. Já nem lembrava mais do cansaço. A vista era algo impressionante. Cruzamos um trecho que historicamente fica bem molhado e com lama, mas a ausência de chuva, deixou tudo muito seco, sorte nossa. Contornamos a lateral da grande rocha e nos dirigimos ao acampamento sul. Já havia um grupo por lá. Nos ajeitamos nos poucos espaços que sobraram e aí pude descansar, após fazer uma boa refeição.
O dia foi terminando e com isso o frio veio com força. Aproveitei para mostrar o Mirante Sul fica na de frente para o fundo da Baía de Guanabara. Era entardecer quando começamos a andar. Fomos nos guiando por totens espalhados pelo caminho. Assim que chegamos lá, pudemos contemplar um espetáculo. Havia uma névoa que encobria um pouco, mas podíamos ver toda a Baía de Guanabara, Niterói, Rio de Janeiro, etc. A noite foi caindo e as luzes davam um tom maravilhoso. Mas tudo tem seu preço... O frio foi aumentando e já foi ficando difícil ficar ali. Era hora de voltar. Fomos procurando os totens e com cuidado chegávamos novamente ao acampamento. Cantamos parabéns para a Andréa, que faria aniversário na próxima segunda feira e cada um foi procurando sua barraca. Ainda fiz um lanche rápido para tentar esquentar um pouco mais. Um dia perfeito. Era hora de dormir e descansar para o dia seguinte que seria duro.
2º dia da Travessia Petrópolis x Teresópolis
Foi uma noite tranquila. Havia levado um saco de dormir com temperatura de conforto bem baixa e isso fez a diferença. O benefício da noite bem dormida compensou o peso extra. Acordei bem cedo na intenção de ver o sol nascer, mas estava com um pouco de nuvens e isso atrapalhou um pouco. Com a certeza de que não teríamos aquele nascer do sol fantástico, aproveitei para fazer um café e comecei a organizar as coisas. Fui de barraca em barraca acordando o pessoal para que não atrasássemos na saída. O dia seria longo. Aos poucos, todos foram levantando e começar a nos organizar. Em pouco tempo o acampamento foi desmontado e saímos com um pouco de atraso, mas nada que pudesse atrapalhar o dia. Coloquei a mochila nas costas e comecei a andar. Passei por dentro dos Castelos do Açú, um grande amontoado de imensos blocos de pedra. Perdi as contas de quantas vezes passei por ali, mas ainda continua me impressionando! Já ao “lado de fora”, de frente para o Abrigo do Açú, paramos durante um tempo para algumas fotos. A vista estava fantástica. Impossível não parar! Dali seguimos andando. Uns pararam para pegar água no abrigo. Passamos pelo camping Norte e seguimos para a descida do lajeado que antecede a subida do Morro do Marco. Do alto já era possível ver a subida no lado oposto. É uma descida bem bonita e considero boa para o aquecimento. Cruzamos o vale e iniciamos a subida. O ritmo diminuiu, mas seguimos subindo de forma constante. Já no alto do Morro do Marco, fizemos uma parada rápida para recarregar as baterias.
Recomeçamos a caminhada. Errei o caminho e só percebi depois de alguns metros. Voltamos e pegamos a saída certa. Descemos em direção ao Vale da Luva com ventinho bem gelado, mas como o dia estava bem aberto, o sol da manhã compensava o frio. Foi uma descida tranquila, exceto por alguns trechos bem erodidos. E alguns pontos, formavam grandes degraus. Estava bem seco e já havia passado ali com bastante lama, o que deixava o terreno bem escorregadio. Mais alguns minutos e estávamos entrando no Vale da Luva. Foi só o ficarmos abrigados do sol que o frio veio com força. Mesmo sem vento nesse ponto. Fizemos uma rápida parada para que alguns pudessem pegar água e seguimos para o trecho mais forte do dia. Já no início da subida, achei um isolante caído na borda da trilha. Achei que fosse do João e o guardei na parte externa da mochila. Nesse início, temos que usar bem as penas. São trechos íngremes e escorregadios. Algumas árvores e raízes servem de apoio, facilitando a ascensão. Até que passei rápido, considerando o peso da minha mochila. Passamos por algumas lajes, buscando sempre o ponto mais limpo. Olhando para trás, é possível ver parte do caminho. Íamos nos distanciando. Depois de um certo, já conseguia olhar para baixo. Sinal de já havia ganho uma altura considerável. E isso também era um bom sinal: Faltava menos do que faltava há alguns minutos atrás. Mais ou menos do meio para cima, o terreno piora com o aumento da lama. Com cuidado para não sujar muito as botas, segui subindo, ganhando uma diagonal para a direita. Enfim chegamos! Segui até a totem e joguei a mochila num canto, aliviando as costas. Como é bom descansar! Fiz um lanche rápido e optei por ir até o cume do Morro da Luva, pois mesmo passando por ali inúmeras vezes, ainda não havia o conhecia. Foi uma caminhada bem rápida. De volta ao grupo, esperamos mais alguns minutos para poder retomar a caminhada.
Depois de uma rápida parada, pois a nossa pausa mais longa seria no “Vale das Antas”, voltamos a caminhar. Seguimos pelo costão, subindo levemente, até chegarmos ao ponto onde descemos um costão. Havia um grampo, com certeza para ser usado em dias de chuva. Já no final, seguimos em direção ao cume do “Dinossauro”, caminhando por um trecho levemente inclina, em direção a uma passagem entre uma espécie de dois cumes. Cruzamos a passagem e seguimos para a esquerda já vendo o “Vale das Antas” ao fundo. Foi uma descida com trechos íngremes e por vezes, escorregadios. Nesse ponto todo cuidado era pouco. Do outro lado do vale, era possível ver o “Dorso da Baleia”, uma formação rochosa que se destacava em meio a vegetação. Era um trecho alto, um prenúncio do que ainda teríamos pela frente. Em pouco tempo, estávamos numa pequena clareira. Ali, pudemos captar água e fizemos um lanche reforçado. Ficamos conversando durante um tempo, aproveitando para descansar bem. Teríamos uma forte subida pela frente.
Após um bom descanso, era hora de voltar a caminhada. Puxei a fila e atravessamos a pequena ponte sobre um córrego e dali, começamos a subir. Fomos deixando o Vale das Antas para trás ou melhor, para baixo. A medida que subia, o ritmo diminuía. Mas o corpo foi aquecendo e consegui manter os passos constantes, apesar de lento. No alto, cruzamos um charco que vem aumentando ao longo dos anos. Lembro claramente da primeira vez que havia passado ali. Era um caminho estreito, bem difícil. Não tinha muito opção a não ser escolher o local onde achava que o pé afundaria menos. Mas com o fluxo intenso de pessoas, a pequena passagem foi se alargando, pois, as pessoas acabam usando a vegetação lateral para se apoiarem. E a tendência é piorar. Passado o trecho, veio mais uma subida e cheguei ao “dorso da baleia”, um lajeado já bem próximo ao final da subida. Passamos por ela e fomos para somente no totem da Pedra da Baleia. Estávamos com uma vista fantástica para o Garrafão, bem como a parede lateral da Pedra do Sino. Encaminhávamos para o trecho final, antes da descida da Trilha da Pedra do Sino. Fizemos uma parada rápida. Entraríamos os trechos mais técnicos da travessia: o mergulho, o cavalinho e o coice.
Mochila nas costas, era hora de caminhar. Depois de várias fotos de frente ao Garrafão, seguimos andando em direção ao colo entre a Pedra da Baleia e o Sino. Mas para chegar lá, precisaríamos descer o lance do “Mergulho”. Uma descida bem delicada, num trepa pedra bem alto. Organizamos os grupos para irem descendo um por um e já seguindo para o “Cavalinho”. Na teoria, tudo certo. Na prática, não tão certo assim. Algumas pessoas travaram, devido a exposição e só aceleramos, depois que o Gabriel passou uma corda que ele havia levado. Acho que foi um erro meu não ter levado a corda. De qualquer forma, conseguimos passar e continuamos andando. Logo, pegamos a última subida da travessia. Quando nos aproximamos da face lateral do Sino, deu uma engarrafada novamente por conta do “Cavalinho”. O Cavalinho é uma pedra atravessada no meio do caminho, onde devemos subir em uns blocos, ganhando o máximo de altura possível, para aí, conseguir passar a perna, como se estivéssemos montando um cavalo. Não um lance difícil, principalmente para os escaladores e mais altos, mas a altura lateral e o “medo” que as pessoas colocam, acabam afetando o psicológico e muitos acabam demorando excessivamente. Com a corda do Gabriel, demos ajuda aos que precisaram. Fui o último a passar e segui. Acima, tem o lance que chamam de “Coice”. Mais um trecho onde é possível passar com tranquilidade, usando técnicas de escalada. Mais uma subida, passando pela escada e seguimos até a placa que indica a subida para o cume da Pedra do Sino. Nesse ponto, há sinal de celular. Aproveitei para mandar algumas mensagens e dar sinal de vida. Retomada a caminhada, foram mais alguns minutos até chegarmos ao Abrigo 4, onde fizemos uma parada para o almoço. Faltava apenas a descida do Sino.
O sol estava maravilhoso. Mas na sombra o frio era forte. Era só ir pegar a água para sentir. Fiz um lanche reforçado, alguns optaram por preparar o almoço. Fiquei no sol durante todo o tempo o que fez dar um ânimo novo, muito importante para esse trecho final. Muita gente opta por fazer em 3 dias, terminando ali o segundo dia e fazendo no terceiro dia a descido do Sino. Mas como para fazer em 3 dias, precisamos de uma folga na segunda feira ou na sexta, fazer em 2 dias é o mais viável, principalmente, porque a descida do Sino, apesar de longa, não tem dificuldade técnica. Já era hora de finalizar. Aos poucos, todos foram se preparando e iniciamos a descida. Cada um acabou indo no seu próprio ritmo. Cruzamos a área de camping e pegamos a trilha. Fomos deixando o Abrigo 4 para trás, mas nem deu para pensar muito nisso, o cansaço já estava batendo na porta. Fomos serpenteando num caminho bem agradável. Passamos pela entrada da trilha do Papudo e mais a frente, a Cota 2000. Optei por seguir, normalmente pela trilha do Sino, evitando pegar o caminho do Paredão Paraguaio, que se encontra bem sacrificado, muito pelo alto fluxo de pessoas. Seguimos descendo naquele piloto automático, fazendo uma parada rápida num ponto ao meio da trilha e depois, parando na Cachoeira do Véu da Noiva. Dali seguimos direto até ao estacionamento. Pela hora, daria tempo de fazer uma parada no Paraíso Café. E seguimos para lá. Estacionamos já quase próximo do fechamento e com pouca opção, fizemos um lanche. Daí, foi pegar o caminho de volta...
Foram 2 dias intensos, com tempo maravilhoso. Uma sorte poder desfrutar de excelente companhia e essa vista fantástica na Travessia mais clássica do Brasil, a Travessia Petrópolis x Teresópolis.
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