Participantes: Leandro do Carmo, Marcelo Correa, Ary Carlos, Blanco Pinheiro e
Guilherme Gregory
Dicas para escalar a Agulha do Diabo
É uma atividade pesada. Só de caminhada de aproximação,
leva-se, em torno de 4 a 5 horas. A caminhada após o Mirante do Inferno é a
mais crítica e costuma ficar bem úmido, dificultando bastante, por isso, avalie
caso esteja em período chuvoso. Muita gente opta por acampar no Paquequer, numa
pequena área antes do Mirante do Inferno (mas deve-se pedir autorização com o
Parque), para sair bem cedo no dia seguinte. A escalada em si consiste em
lances de entalamento e chaminés. O lance final é feito em cabo de aço. No
cume, o espaço é limitado e cabem poucas pessoas. Não é muito comum encontrar
grandes grupos escalando, mas há possibilidade. Se for fazer em um dia, comece
bem cedo e tenha certeza de que voltará parte do caminho durante a noite.
Como chegar à Agulha do Diabo
Na trilha para a Pedra do Sino, logo após a Cota 2000, há
uma saída para a esquerda. Essa trilha é conhecida como “Caminho das
Orquídeas”. Siga descendo e vire à direita na bifurcação. Seguirá por um longo
caminho até chegar ao acampamento Paquequer, um pequeno descampado, onde cabem
poucas barracas. Dali, cruzará o rio Paquequer e subirá em direção ao Mirante
do Inferno. Pegar uma saída à esquerda, que te levará ao colo entre o Mirante
do Inferno e o São João. Descerá à direita, até a base da Agulha e subirá um trecho
bem úmido.
Vídeo da Escalada na Agulha do Diabo
Relato da Escalada na Agulha do Diabo
Enfim havia chegado o grande dia. Há alguns anos atrás,
quando fiz o curso básico de escalada, ouvi alguém dizer sobre uma escalada na
Agulha do Diabo. Como não conhecia, fui logo pesquisar. Na primeira pesquisa,
eis que surge uma foto simplesmente fantástica! Numa primeira análise, parecia
algo impossível... Mas era naquele momento. Porém, algo me dizia que um dia
estaria lá...
O tempo foi passando e foram algumas tentativas... Ora o
tempo não ajudava, ora compromissos pessoais... Sempre tinha alguma coisa que
me fazia adiar. Mas não desisti e nem desanimava, toda vez que passava pelo
Parque Nacional da Serra dos Órgãos, me certificava de que ela estava lá a me
esperar. E passou tanto tempo, que ficava até com um pouco de vergonha, quando
o assunto Agulha do Diabo vinha a tona e eu falava que ainda não havia ido.
Estava na hora de passar isso a limpo!
Eu, Ary Carlos, Marcelo Correa e seu filho, Lucas, havíamos
marcado de escalar a Agulha dois meses atrás. Pensa naquela noite estrelada...
E foi assim. Entramos no parque às 6 da manhã com um dia aberto e firme. Foi só
passar da altura do antigo Abrigo 2 que as nuvens estavam lá estacionadas,
trazendo uma chuvinha rala... Ainda chegamos ao início da descida do Caminho
das Orquídeas na esperança do tempo abrir, mas nada... Havia parado na garganta
o grito de gol.
Dessa vez tinha tudo pra dar certo. Estávamos num período
forte de estiagem. Tudo muito seco. Apesar das condições difíceis para a
vegetação e animais, estar seco, facilitaria a muito a caminhada de
aproximação. Dessa vez, eu, Ary Carlos, Marcelo Correa, Guilherme Gregory e o
Blanco Pinheiro nos organizamos para, enfim, escalar a tão sonhada Agulha do
Diabo. Saímos as 4:30 da manhã de sábado. O Marcelo Correa nos esperava em
Teresópolis. A viagem foi tranquila e com a estrada livre chegamos cedo em
Teresópolis. Já havia gente na portaria, prenúncio de um dia cheio no
PARNASO. Acertamos tudo e seguimos para
a Barragem. Lá nos preparamos e tivemos
que descer para deixar o carro estacionado mais embaixo.
Enfim começamos a caminhada. Eram 6:30 da manha e nossa
previsão de chegada à base, seria por volta das 10:30. Começamos a subida e
fomos num ritmo bom. Cruzamos o local do
antigo Abrigo 1 e passamos pela Cachoeira do Véu da Noiva completamente seca.
Isso mesmo, completamente seca. Ainda não havia visto algo parecido. Seguimos e
mais acima, na Cachoeira do Papel, mais uma decepção, só existia um pequeno
filete de água, que mal dava para encher as garrafas. Tratei logo de encher minha
garrafa extra, não sabia se o Paquequer estaria com água.
Continuamos a subida e usamos a subida pela base do Paredão
Paraguaio, na Pedra da Cruz para ganharmos um pouco mais tempo, apesar da
subida mais forte. Quando chegamos na laje, já na descida para o Caminho das
Orquídeas, onde havíamos voltado da última vez, nos deparamos com uma vista
fantástica. O dia estava completamente limpo. Uma leve brisa balançava as
folhas das árvores. Pequenas nuvens contrastavam com o céu azul. Um espetáculo.
Descemos com o piso seco e foi mais fácil que das últimas
vezes que havia ido ao local. Descemos o grotão e logo chegamos no Abrigo
Paquequer. Um pequeno local de acampamento muito utilizado para quem faz a
Agulha do Diabo em dois dias. Muitos preferem pernoitar no local e acordar cedo
para escalar. Existe o incômodo de subir com mais peso, mas cada um define sua
estratégia. Ali a água era escassa, mas em maior quantidade. Enchemos novamente
nossas garrafas. E seguimos subindo em direção ao Mirante do Inferno. No caminho
pegamos o caminho da esquerda, em direção ao São João. Descemos um terreno
instável e até que chegamos ao colo entre o Mirante e o São João. Dali,
descemos à direita em direção ao Vale da Geladeira.
É uma descida técnica e difícil, apesar de seca. Muitas
pedras soltas. Havia muito limo seco nas pedras. Fiquei imaginando como seria o
local molhado... Ficou apenas na imaginação. Dali, a vista da Agulha era
fantástica. Estávamos a uma distância razoável o que nos permitia ver com
detalhes, alguns dos lances clássicos da escalada, como o Cavalinho. E
continuamos a descida. Em um determinado ponto começamos a subir em direção à
Agulha. O caminho era mais difícil. Mais uma vez agradeci a seca... Fomos
ganhando altitude e chegamos a uma gruta, onde entramos e fizemos um lance de
chaminé até chegar ao alto da pedra, na volta, faríamos um rapel num grampo que
havia ali no alto. Dali chegamos a um pequeno largo e com mais uma subida,
estávamos na base da escalada!
Fizemos um lanche e nos preparamos para a escalada. Deixamos
nossas mochilas e levamos somente o necessário. No casa do Agulha, a mochila
iria atrapalhar os vários lances de entalamento e chaminés estreitas. Dividimos
em duas cordadas. Eu e o Macelo fomos na frente e o Blanco, Ary e Guilherme por
último.
O Marcelo guiou a primeira enfiada. Fui observando o
movimentos, pelo menos os primeiros, logo acima, já se perde o contato visual.
Assim que ele chegou à parada, foi hora de seguir. O primeiro lance olhando de
baixo parece simples, mas as fendas são cegas e é preciso posicionar bem o pé
esquerdo para sair bem e dominar o lance. Logo acima vem um bloco, um pouco
mais fácil que o de baixo. Seguimos mais
uns trepa pedras até pegar uma diagonal para cima. Primeira parte finalizada!
Chegou minha vez de guiar. Sai da primeira parada e a
segunda enfiada começa com um lance de entalamento. Subi um pouco e protegi com
um camalot, melhorando o psicológico do trecho. Tentei uma vez, mas não
encaixei e na segunda tentativa, me posicionei melhor, usando as pernas e o lado
do corpo até subir mais um pouco e chegar próximo ao grampo, quando pude passar
a costura e ficar protegido. Um lance bem bacana. Daí pegar uma horizontal para
a esquerda numa fendinha, seguindo na ponta dos pés. Uma boa agarra acima
deixou o lance bem tranquilo. Depois foi seguir uma pequena e delicada trilha
até a parada dupla utilizada para o rapel, onde montei a segunda parada. O
Marcelo veio logo em seguida. Dali já pude ver a outra cordada chegando.
Seguimos todos mais ou menos juntos.
Subi uma pequena trilha, num caminho já bem marcado. Alguns
trechos estão bem instáveis e é preciso atenção. Passei por baixo de uns
grandes blocos até a base de mais uma chaminé. Dali dava para ver o quanto
vertical era o trecho. Já estávamos bem próximos do nosso destino. O Marcelo
guiou esse lance. Segui até o final da chaminé e subi até um buraco, onde
entrei até o lado de fora, passando com um pouco de dificuldade. Daí foi subir
mais um pouco e ir andando pelas pedras suspensas até uma grande pedra
entalada, bem acima de onde entramos. Deu um pouco de arrasto na corda. Chegou
até a prender em alguns momentos. Em cima dessa grande pedra, dá para ver o
grampo um pouco mais alto. Na técnica de oposição, dominei o lance, até chegar
ao grampo onde o Marcelo já havia deixado uma fita, fazendo um artificial até
um confortável platô.
Nesse ponto, podíamos ver toda a extensão da Chaminé da
Unha. Estávamos de frente para o São João e podíamos ver um grupo lá no alto. Ali,
a vista surpreendia... Enquanto a cordada de trás subia, fui me preparando para
o famoso lance do Cavalinho. Já estava pronto e o Marcelo me passou algumas
dicas. Dei uma olhada antes e respirei fundo e subi um pouco depois do grampo
afim de pode encaixar primeiro o ombro para poder me equilibrar. Depois, foi
chegar um pouco para frente e colocar a perna esquerda. Alguns escaladores até
passam em pé, mas preferi fazer o lance da maneira mais comum e na qual achei
mais fácil... Segui devagar, sempre me apoiando bem. Olhei para baixo e vi o
quanto estava alto. Tratei logo de olhar para frente e me concentrar, faltavam
apenas alguns metros para completar. O Marcelo me chamou e bateu uma foto.
Segui até a ponta e optei por entrar completamente na fenda. Como sou magrinho,
não tive dificuldades. Saí do lance entrei numa estreitíssima chaminé. Era tão
estreita que foi fácil dar segurança dali para o Marcelo.
Assim que ele completou o lance, segui para o outro lado, já
me preparando psicologicamente para a Chaminé da Unha. Vou aqui descrever um
pouco esse trecho. Trata-se de uma gigantesca laca, que está equilibrada em uma
das faces, já próxima ao cume, formando uma grande e regular chaminé. Diz a lenda que ela até balança! Brincadeiras
a parte, não seria eu o responsável por descobrir a verdade!!! Foi hora de me
preparar para guiar mais esse trecho, talvez o melhor da escada. Talvez não,
com certeza.
De onde estava, podia ver um grampo muito alto. Pensei que
fosse o primeiro, mas chegando um pouco mais para frente, pude ver que era o
segundo, mas mesmo assim, estava alto. As proteções são aquelas padrão chaminé
que conhecemos bem: um grampo lá longe e outro muito lá longe... Sem muito enrolar e aproveitar o corpo
quente, toquei para cima. Como movimentos sincronizados, fui ganhando altura e
mais altura. Já não tinha como voltar atrás... A parede é bem aderente e
regular. Comecei o lance de frente para o São João, seguindo a dica do Marcelo.
Protegi no primeiro grampo e segui para um degrau, onde pude descansar um
pouco. Consegui fazer algumas fotos e nesse ponto, virei de costa para o São
João, visto que unha fica convexa ao seu final, isso facilitaria terminar o
lance.
Segui subindo e protegi num grande, antigo e torto grampo.
Fui ganhando altura e olhando para cima, a alça do cabo de aço já se
aproximava. Faltavam apenas alguns metros... Com aquela vontade de chegar rápido, parecia
que o cabo se distanciava. Concentrei e parei de me preocupar. Quando olhei
novamente, ele já estava na altura da minha cabeça. Apoiei com mão no cabo e
subi mais um pouco até passar para o topo da unha. Ali foi descansar um pouco e
apreciar a fantástica vista. Descansei um pouco e dei segurança ao Marcelo que
rapidamente chegou. Estar ali é algo que dificilmente conseguirei descrever...
Bom, faltava o último trecho. O lance do cabo não tem muito
mistério, mas todo cuidado é pouco. Fui subindo e passei por um trecho bem
vertical, até que foi perdendo inclinação. Pronto, estava no cume. Realizava um
sonho. Sozinho por um instante, com aquele dia maravilhoso, foi difícil conter
as lágrimas. Uma mistura de sentimentos entre realização, alegria, alívio,
etc... Rapidamente olhei em volta e me posicionei no centro do pequeno cume e
agradeci a Deus por estar me proporcionando esse momento mágico. Poucos terão a
oportunidade que tive. Por instante refiz todo o caminho que percorri até ali.
Fechei os olhos e respirei fundo, me fazendo voltar a escalada, afinal de
contas, tinha completado a metade do caminho.
Me prendi ao grampo
que fica ao lado da caixa metálica onde se encontra o livro de cume e montei
segurança para o Marcelo que subiu rapidamente. Quando ele chegou ainda falei:
“Missão cumprida”. Ele me respondeu: “Ainda falta a volta”. Pois é, completamos
apenas metade da missão! Enquanto a outra cordada não chegava, batemos várias
fotos para registrar e tivemos a sorte de ter outros grupos no São João e
Mirante do Inferno. Um moça que estava no Mirante do Inferno nos viu no cume e
gritou: “De qual clube?” Eu respondi: “Niteroiense” . Aos poucos todos foram chegando e conseguimos
nos reunir no pequeno cume. O dia continuava perfeito. Começamos a nos preparar para descer. Seguimos
por dois rapeis até a base de um bonito e mais baixo cume, chamado de Agulha da
Neblina. O Blanco escalou e eu me arrependi profundamente de não ter ido... Mas
tudo bem, ficará para a próxima...
Descemos uma pequena trilha e fizemos mais um rapel até a
base, onde havíamos deixado nossas mochilas. Fizemos um lanche e foi hora de
pegar o longo caminho de volta até a barragem. Às 18:00, estávamos de volta a
Trilha do Sino e as 20:00, chegávamos na Barragem.
Agora sim, poderia dizer:
Missão cumprida!
Base da via
Lance do Cavalinho
Chaminé da Unha
Leandro do Carmo e Marcelo Correia no cume
Leandro do Carmo escalando o lance final
No lance final
Ary chegando ao cume
Leandro, Ary e Marcelo
Marcelo Correia (em pé) e Leandro do Carmo no cume
da esquerda: Blanco, Ary, Marcelo, Leandro e Guilherme