Remada no Rio Paraíba do Sul: De Porto Velho do Cunha à Itaocara
Tempo: 8h 40min
O Rio Paraíba do Sul
O Rio Paraíba do Sul é um rio extenso sendo recurso extremante importante para três estados do sudeste brasileiro: São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Nasce na serra da Bocaina em São Paulo e desemboca na praia de Atafona em São João da Barra - RJ possuindo 1.340 km de extensão abrangendo 150 cidades e 20 milhões de pessoas.
Ao longo de seu trecho o rio adquire várias formas e tem características bem específicas: ora estreito, ora largo, ora turbulento, ora calmo, às vezes represa e volta a ser rio, ora poluído, ora preservado, sim é isso mesmo, preservado e com mata ciliar e vegetação exuberante e é esse rio Paraíba do Sul que pouca gente conhece.
No Médio Paraíba, mais especificamente do trecho de Além Paraíba-MG a São Fidelis-RJ, o rio Paraíba do Sul possui águas turbulentas com corredeiras e cachoeiras, predominância de ilhas, é largo e com uma vegetação ciliar ainda bem preservada. Famoso pela piscosidade e referência na pesca esportiva de dourado e robalo. Em uma grande extensão não existe cidades em suas margens, o que contribuí para renovação de suas águas, além da própria oxigenação causada pelas corredeiras. Ele também recebe as águas de vários afluentes. Fonte: ACAI
Dicas para remar na região
Detalhes do trecho de Porto Velho do Cunho até SãoFidelis
Caminho que fizemos de carro de Itaocara até Porto Velho do Cunha, local de início.
Trecho feito
Vídeo em HD - Remada no Rio Paraíba do Sul: Porto Velho do Cunha à Itaocara
Relato
Quando o Jefferson me falou que iria fazer o trecho de Porto Velho do Cunha x Itaocara, remando, logo me convidei, sem dar tempo dele contar alguma história triste dizendo que iria sozinho ou que já tinha um grupo fechado... Bom, depois fui ver se realmente dava para eu ir. Mas se não desse, daria um jeito, era uma oportunidade única. Como moro muito longe de Itaocara e de não conhecer bem o local, ficaria bem difícil ir sozinho. Resolvi ir de ônibus. Reservamos as passagens para o final do dia, pois a viagem seria véspera de feriado e a procura naquele horário é bem grande.
Depois da logística organizada, foi hora de estudar o percurso. Pelo relato que ele publicou há um tempo, a remada totalizaria cerca de 60 km, com trechos longos de águas calmas e algumas corredeiras. Essa seria uma distância na qual eu ainda não havia remado, mas avaliei que rio abaixo, seria mais tranquilo. Engano meu, mas essa parte da história vai ficar para daqui a pouco. Preparei o equipamento que eu tinha e vi o que precisaria, sendo providenciado lá no clube de canoagem. A semana passou rápida e o grande dia havia chegado.
Saí direto do centro do Rio para a rodoviária de Niterói. Foi meio correria, mas chegamos bem à rodoviária, fazendo uma viagem tranquila até Itaocara. Estava frio, o termômetro marcava 10°C. Até os cachorros estavam escondidos. Já eram quase 2 da manhã e daqui a pouco já tínhamos que estar prontos para a saída. Fizemos um lanche e deixei tudo pronto, assim poderia tirar alguns minutos a mais de sono.
Levantamos às 5h e fomos ao clube de canoagem pegar parte do equipamento para eu usar. De lá, seguimos para a casa do Markley, onde os caiaques já estavam arrumados na carretinha. Demos uma parada rápida numa padaria para encontrar o Wendel e tomar um café. Estava tão frio quanto à noite anterior, mas como estava me movimentando mais, nem senti tanto. A noite estava bem aberta, sinal de que teríamos um dia bem agradável. Pegamos a estrada por volta das 6h e chegamos a Porto Velho do Cunha por volta das 7h 30min, tudo dentro do programado. De Itaocara até lá, são cerca de 95 km.
Já na entrada do caminho que leva ao rio Paraíba do Sul, tiramos os caiaques e os alinhamos numa entrada que seguia até o rio. Naquele ponto, dava para perceber onde o nível da água havia atingido no último período chuvoso, algo bem assustador. Pegamos todos os equipamentos e fomos ao ponto de saída, ainda fazendo uma pequena caminhada. Ali, nos arrumamos. Tinha uma forte serração, o que fazia parecer que a água estava em ebulição, dando um aspecto bem diferente àquela fantástica paisagem. O rio corria lentamente. Do Outro lado da margem uma mata bem densa, dava um toque especial ao local.
Acesso ao rio Paraíba do Sul |
Com tudo pronto, foi hora de entrar na água. Na primeira remada senti o caiaque deslizando calmamente sobre as águas, uma sensação fantástica. A partir daquele momento eu ele seríamos um só até ao final da jornada. Estava usando um remo de fibra de carbono, muito diferente do que estou acostumado a usar. Aos poucos, fui acostumando com o novo ritmo. Nesse trecho inicial, as florestas das margens estão bem protegidas. A remada cadenciada ajudou a espantar o frio. A serração foi se dissipando e já era possível ver o contorno do sol. Em pouco tempo teríamos céu aberto.
Logo à frente, a floresta que já era densa, ficou mais fechada ainda. Passamos pelo ponto onde o Rio Angu deságua no rio Paraíba, um belo local. Depois de bastante tempo remando o Jefferson percebeu que havia deixado o celular dele em cima de um barco que estava no local de onde partimos. Tentamos ligar, mas lá não tinha sinal. Encontramos alguns pescadores que estavam acampados na margem do rio e tentamos contato novamente, mas nada.
Seguimos rio a baixo. Passamos por algumas pequenas e fáceis corredeiras. O sol apareceu. A cerração dissipou totalmente, mostrando um céu azul e sem nuvens. O astral estava ótimo, seguia sempre um pouco mais atrás, assim tinha certeza de onde seria o melhor local para passar. Por volta das 10h, chegamos a uma parte do rio onde formava um extenso degrau. O Markley seguiu na frente e o Jefferson parou para orientar a descida. Nesse ponto, algumas pedras afloravam, mas a descida era suave.
Neblina baixa no início da remada |
Mais alguns minutos remando e estávamos no Bar da Manuela. Já havíamos remado cerca de 20 km e ali, marcava 1/3 do caminho. Um ótimo ponto de apoio. Ali, fizemos uma rápida parada, continuando a remada logo em seguida. Passamos por São Sebastião do Paraíba, quarto distrito de Cantagalo. Já estávamos há cerca de 3h remando e podíamos contar facilmente a quantidade de casas que tínhamos visto nas margens. Uma paz sem precedentes, que era interrompida apenas pelo som das águas nas corredeiras que se seguiam. Apesar de estarmos bem imersos numa natureza intocada, não havia visto nenhum animal, somente o som dos pássaros. Talvez, pela rapidez com que passava pelos locais, não prestava tanta atenção.
Continuando a remada e mesclando longos trechos de águas calmas e pequenas corredeiras, chegamos ao Bar do Ernani. Mais um ponto de apoio nessa aventura. O local estava fechado, mas ali fizemos nossa primeira parada longa, algo em torno de 30 minutos. Aproveitamos para “almoçar” uns saborosos sanduíches preparados pela Isadora, filha do Jefferson. Aproveitei para fazer algumas imagens de drone, mas não havia verificado o cartão de memória e as imagens foram salvas em baixa resolução. Passado o tempo de parada, voltamos para a água, faltavam ainda um pouco mais da metade do caminho.
Sentia-me bem, mas não sabia se estava remando mais lento que os outros, de qualquer forma continuei no ritmo que dava, não queria atrasar. Mas pelo que havia lido no relato feito pelo Jefferson, estávamos dentro do programado. Passamos pelo Porto do Tuta, local de saída dos últimos eventos de canoagem organizados pela ACAI. Esse trecho que ia até Porto Marinho, era um que estivera em duas oportunidades, então já tinha certo conhecimento. Logo à frente, estaria a corredeira mais forte de todo o trecho: a corredeira do Urubu. O Urubu é uma corredeira classe III e pode ser facilmente transponível pela margem.
Seguimos o fluxo do rio passando por mais uma corredeira e mais a frente nem deu muito tempo de pensar. O Jefferson sinalizou pra remar. Não tinha alternativa a não ser remar. Sabia que o Urubu estava a poucos metros. O Markley e o Wendell já tinham ido e lá embaixo vi a ponta de um caiaque para o alto, alguém havia capotado. Mas foi tão rápido que quando eu vi, já estava em cima da corredeira. O Jefferson estava um pouco mais na frente. Entrei nela e fui equilibrando com remadas fortes, a fim de manter a linha correta. Num piscar de olhos, vi o Jefferson tombando também. Passei um pouco mais para a direita dele. Nem acreditava que havia passado. O Jefferson foi até a margem e fui até lá para descansar e ajudá-lo a tirar a água do barco.
Jefferson na corredeira do Urubu |
Com tudo pronto novamente, voltamos para a remada. Já havíamos passado da metade do caminho. Estávamos, aproximadamente, a cerca de 4 horas remando e era isso que mais ou menos faltava para terminar. Estava cansado, mas remava tranquilo. Veio mais uma corredeira e na aproximação, quando fui alinhar o caiaque, tombei. Ainda tentei ver se desvirava o caiaque, mas não deu tempo. Desci segurando a borda até um ponto mais calmo do rio. O Jefferson veio para dar um apoio. Acho que nadar é pior que remar. Fiquei mais cansado do que quando tive que remar para descer o Urubu. Na margem do rio, tiramos a água do caiaque e reiniciamos a descida. Confesso que fiquei desanimado, capotei sozinho, num trecho muito mais fácil que o Urubu. Talvez tenha sido excesso de confiança ou falta de atenção.
Mais uma corredeira me esperava e não tinha espaço para mais erro. Concentrei e comecei a remada. Tentei cadenciar melhor e só ouvia o Jefferson gritar: rema, rema, rema, não para! E assim desci mais uma, o que elevou um pouco a moral, apesar do cansaço. Dali, passamos por Porto Marinho e seguimos até a Cabana do Peixe Frito, onde fizemos a segunda parada longa do dia. Fizemos mais um lanche. Estava bem cansado, mas tranquilo. Não tinha dúvidas que conseguiria. Já estávamos com 42 km de remada. Faltava pouco!
Saímos numa água parada, trecho em que o rio contornava uma ilha. Seguimos remando até encontrar mais uma corredeira. Entrei nela e já no final, uma onda me jogou para o lado. Não deu mais uma vez, virei e segui segurando o caiaque até a margem, onde pude tirar a água, com a ajuda do Jefferson. O cansaço havia chegado. Estávamos com, aproximadamente, 45 km. A partir daí, diminuí um pouco o ritmo e remava um pouco mais atrás. Passei por mais uma corredeira, agora muito mais concentrado, pois não podia parar de remar. Não queria capotar novamente. Ter que nadar e depois tirar a água do caiaque cansava mais que a remada em si, além de abalar o psicológico.
Já estávamos com quase 50 km de remada. O sol estava forte, eram 15h. Tentava procurar um trecho com sombra, mas não tinha. Restava apenas jogar uma água na cabeça para refrescar. Nesse ponto já podia ver a Serra da Bolívia bem à frente, ainda pequena, mas já era sinal de que estávamos próximo do fim. O Jefferson já me perguntava se estava tranquilo com mais frequência, talvez sentindo que sempre ficava um pouco mais para trás. Isso me manteve motivado, não queria atrasar o grupo. As pequenas corredeiras se transformavam em grandes desafios. Numa corredeira, vi o Wendell capotando. Não tinha jeito. Ou superava ou estaria capotando e tendo remar até a margem. Comecei a remar. O caiaque foi seguindo a ondulação e na onda mais alta, quase tombei. Por sorte consegui manter o equilíbrio do barco e seguir remando até um remanso onde ofegante, consegui descansar um pouco.
Eu em uma corredeira |
Ouvi o Jefferson dizendo que dali em diante não tinha mais nenhuma corredeira. Senti um alívio, mas foi só remar mais um pouco e comecei a ouvir aquele chiado, mais uma estava chegando. Naquele momento, qualquer água mexida virava corredeira. E foi preciso muita concentração para seguir remando. Sabia que estava no fim e que tudo seria resolvido em pouco tempo. Mas alguns trechos calmos e mexidos, até que me dei conta de que a Serra da Bolívia estava ao meu lado e não mais a minha frente. Tinha certeza que estava chegando. De longe avistei um trecho onde o rio se dividia e mais a frente um grande bambuzal. Reconheci o local. Havia chegado. Faltavam poucos metros.
Mais algumas remadas, totalmente no automático e alinhamos os barcos para poder registrar um momento mágico. Com sol se pondo atrás da Serra da Bolívia, após remar 58,6 km em 8h 40min, chegávamos ao final da jornada. Pra mim, um dia épico. Bons momentos carregamos na memória. Mas momentos como esse, carregamos também no coração.
Após guardar os barcos, o Jefferson ainda foi tentar recuperar o celular que havia deixado no ponto de saída. Não conseguiu no dia, mas após fazer contato com um morador de Porto Velho do Cunha, conseguiu recuperá-lo no dia seguinte. Ainda tirei uma soneca, só esperando a hora do ônibus que me levaria de volta pra casa. Estava esgotado fisicamente, mas com a mente leve. Um grande dia.
Eu e o Jefferson |
Notem a marca da água!!!! |
Caminho precário para chegar ao rio |
Iniciando a remada |
Saindo da Cabana do Peixe Frito |
Wendell remando |
Trecho bem bonito, próximo ao bar da Manuela |
Águas calmas |
Dia bem aberto |
Bar do Ernani, 1/3 do caminho |
Jefferson na corredeira do Urubu |
Jefferson indicando a linha para descida |
Eu passando por uma onda |
Comemorando o fim da remada com um por do sol fantástico |
Chegada no Kayak, SUP & Club |
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